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Enquanto vocês crescem

  • Foto do escritor: Rejayne Nardy
    Rejayne Nardy
  • 11 de out.
  • 4 min de leitura

Atualizado: 12 de out.

Foto adolescente

Isso de escrever cartas pro passado, pro futuro ou pra quem ainda não está pronto pra ler... não é novidade. Mas continua sendo um jeito eficiente de dar conselhos não solicitados — e aliviar o peso de sentir demais. Clichê, eu sei. Mas os clichês existem porque já foram comprovadamente validados pela vida.


A semana foi uma sequência de episódios derivados da adolescência das minhas filhas. E quando digo “episódios”, quero dizer drama, comédia, suspense — e, em alguns momentos, terror psicológico, tipo quando o marido liga dizendo: “aconteceu algo na escola...”

Então me ocorreu escrever uma carta pra adolescência das Marias. Quero dizer, pras Marias adolescentes que estão. Mesmo sabendo que elas preferem conselhos em links de reels, vídeos curtos do TikTok, frases de impacto e trilha sonora. Mesmo sabendo que acham cringe essas coisas que escrevo.


Tudo certo. Bastante do que eu escrevo é pra mim mesma — e essa é uma forma de lembrar o que senti quando estava no lugar delas e ser mais razoável no papel de mãe de adolescentes. Se, por acaso, as palavras encontrarem outras mães no caminho, que sirvam pra acalmar o peito de quem também tenta decifrar filhos que mudam de humor na velocidade de um stories.


Filhas, eu também me sentia desajustada. De vez em quando, ainda me sinto. A diferença é que, na minha época, a gente não tinha algoritmo pra validar — e agravar — a sensação. Só um diário com cadeado e uma caneta com cheiro de morango.


Hoje, ironicamente, já mais enquadrada, me fascina toda pessoa que consegue ser o que é — com zero preocupação com o que os outros acham.Vocês ainda não vão concordar, mas o desajuste é um bom sinal. Mostra que vocês estão alertas, inteiras, construindo o que faz de vocês únicas. Cada uma a sua maneira.


Vocês são gêmeas, mas completamente diferentes. Iguais só quando usam roupas e penteados parecidos. O resto é pura singularidade: uma sente o mundo no estilo pop dramático; a outra, em ritmo dançante. E tem eu, aqui, tentando não perder o rebolado no meio das duas, levando olhares de deboche quando escuto meus sertanejos...


Eu tento entender vocês. Estudo pra entender. E principalmente pra aceitar que vocês precisam pertencer a algo que não seja mais familiar — algo que faça sentido só pra vocês, mesmo que me soe estranho. Respeito, com o coração aflito, as escolhas que eu não faria. E consolo, do jeito que posso, as decepções que vêm depois.


Aquela amizade que precisei esperar uma de vocês desistir.

Aquela prova que naufragou por excesso de confiança.

Aquele corte de cabelo que deu errado — de novo.


E virão outras versões disso: o amor que vai parecer infinito e acabar numa terça-feira qualquer; o primeiro emprego e aquele chefe difícil de lidar; o sonho que muda de forma, o corpo que muda de humor, os cabelos que mudam de cor porque o plano também virou outro.


Uma das coisas mais demoradas da vida é descobrir o próprio estilo — de roupa, de música, de gente, de caminho. É comum passar um bom tempo tentando se vestir pra combinar com a turminha, até perceber que a melhor roupa é a que combina com quem somos. O mesmo vale pras relações: quando você precisa pensar demais se está confortável, provavelmente não está. Fiquem atentas a isso.


Quanto mais rápido vocês aprenderem a rir de si mesmas, mais fácil fica viver. Rir das fotos antigas, daquele tombo no meio da sala, das lágrimas que hoje parecem drama. A vida melhora quando a gente encara os dias como atuar numa grande comédia — e finge pra gente mesmo que tropeçar faz parte do espetáculo, não é a peça inteira.


Pessoas especiais vão chegar. Algumas vão parecer feitas sob medida — e ainda assim, vão embora. Outras, a gente vai precisar deixar pra trás porque mudamos, porque estaremos nos curando de um desalento qualquer. E tudo bem. Ninguém é vilão na roda-viva da mudança.


O que quero muito que vocês aprendam a se ouvir. A escutar aquele incômodo que parece cisma, mas nunca é. Essa intuição é o radar que a gente ganha de presente e passa a vida tentando ignorar. Escutem. Mesmo quando o mundo disser que é exagero, drama, TPM.


Não julguem outras mulheres. Nem qualquer pessoa que estiver se expondo de coração aberto por aí. O mundo já faz isso com crueldade suficiente. Sejam admiradoras da vida e das pessoas. Olhar pro outro com amor, antes de tudo, faz bem pra quem olha. E se preservem dessas conversinhas maldosas da adolescência — elas passam rápido, mas deixam marcas. Fujam pra longe da criticidade aleatória.


E, por favor, nunca achem que demonstrar carinho é sinal de fraqueza. Entreguem afeto sem medo de parecerem “amorosas demais”. Mas também saibam recolher o mesmo afeto quando ele não encontrar casa. Quando bater na porta errada uma, talvez duas vezes, e não for recebido com cuidado — é hora de dar meia-volta.


Sigam. A vida é movimento, e parar às vezes é o mesmo que desistir de crescer. Crescer, aliás, é um verbo confuso nessa fase. Tipo Alice no País das Maravilhas, tentando entender onde encolheu e onde esticou demais. Mas o que realmente cresce, se a gente deixa, é sempre a consciência.


A de que mudar é natural, é ganhar repertório.

A de que o novo assusta, mas é ele que faz a vida andar.

A de que nada é pra sempre — e ainda bem.


A vida não é um feed que dá pra editar. O enquadramento fica torto, o filtro sai borrado, a legenda não combina. E mesmo assim, é ali que ela acontece — no improviso, nas versões inacabadas, nos dias que a gente esquece, mas que deixam aprendizados que nos tornam quem somos.


Eu sei que vão errar, que vão jogar geleca no teto, que vão cair e duvidar das próprias escolhas. Mas saibam que nesses momentos eu vou estar ainda mais perto — com um amor incondicional, fazendo o que for possível pra que se levantem rápido, pra que queiram tentar de novo, pra que se lembrem de quem são antes de se perguntarem quem devem ser (só pra agradar).


No fim, filhas, o que eu mais quero é que vocês vivam tudo com coragem e humor. E que nunca deixem de se escutar — porque é de dentro da gente que as dúvidas se dissipam, que os desajustes ganham forma autêntica e admiração.


Com amor, mamãe (que, no futuro, vocês vão entender melhor do que agora.)

 

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