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Mundo Exaurido

  • Foto do escritor: Rejayne Nardy
    Rejayne Nardy
  • 27 de set.
  • 3 min de leitura

Atualizado: 5 de out.

Estamos exaustos. Não daquela exaustão que se resolve com sono. É outro tipo: silenciosa, persistente, mesmo se dormimos uma semana inteira. Mil notícias rolaram no meu feed nos últimos dias, todas rasas o suficiente para que eu não consiga conversar sobre nada com profundidade e para que eu já sinta cansaço do que ainda preciso assimilar sobre o que realmente importa.

Vi política como teatro: um presidente de “primeiro mundo” que critica e "pune" outro de “terras tupiniquins”, depois aperta a mão e o elogia como se nada fosse e em seguida assina documentos que trazem novas "dificuldades" pra quem sonha trabalhar em terras “mais promissoras”.

Vi debates intermináveis sobre um filme — uns dizendo que a personagem, moça moderna e materialista, deveria seguir o coração, outros que deveria ser mais racional, outros ainda que precisaria de terapia para lidar com traumas antigos causados pela falta de pai durante a infância, que desperta inseguranças e escolhas em círculos de repetição...

Vi semanas de moda desfilando tantas tendências que já não lembro de nenhuma. Quanto aos nomes dos diretores criativos, de como se deu a dança das cadeiras,  preciso um curso de atualização só para acompanhar.

Ninguém dá conta de tanta informação já há algum tempo. Mas agora o problema se multiplicou: além da informação, temos a desinformação — os fakes, os oportunismos disfarçados de notícia que busca rentabilizar views — e, como se não bastasse, a avalanche de opiniões sobre tudo. É opinião e especialista que não acaba mais. E o pior: algoritmos nos prendem numa sala de espelhos. Só vemos o que já pensamos, só ouvimos quem concorda conosco. Não há chance de confrontar o diferente, de ampliar a visão. O resultado é um conforto perigoso: acreditamos estar certos porque só nos entregam versões de nós mesmos.

 

Muitos acreditam que a solução é se desconectar. Talvez. Mas existe outro caminho: perceber que não precisamos de tanta manifestação, nem de tanta pressa em dizer algo a respeito de tudo. Entender que precisamos de tempo para pensar direito, de contrapontos para abrir perspectivas e o coração. Algumas coisas precisamos saber, outras apenas sentir, e muitas ignorar.

 

Essa disputa por relevância, essa urgência em convencer o outro, está cansativa, inútil e chata. E ainda reflete um perigo. Já vimos que, em importantes momentos históricos, o caos não foi acidente: foi ferramenta, distração manipulada. Enquanto discutimos o vestido transparente da atriz ou a falta de samba no pé que virou meme, a engrenagem segue moendo vidas na surdina. A cortina de fumaça agora vem em alta definição, com trilha sonora e efeitos especiais. Usamos, inclusive, edição da ferramenta nativa para gerar mais alcance para essa névoa toda.

Seria mais convergente — mais global, de verdade — se nossa energia fosse direcionada a temas que nos humanizam. Educação. Saúde física (e mental). Ciência que gera acesso, dignidade e oportunidades. Questões que despertam empatia, e não guerra. Mas não: perdemos tempo em disputas fúteis, em busca do troféu para o (ego) vencedor.

Parece que vivemos tempos modernos, acelerados, inteligentes. Mas, a maioria dá sinais de que a sensação é outra: vamos bugar. Fico em dúvida se é minha idade avançada e a estranheza dos dias atuais comum aos que passam dos 40 ou se estamos num coma às avessas. Acordados, ligados em tudo, mas dormindo no ponto. Olhando para fora como se o futuro já fosse nosso, como se já estivéssemos mais sábios com a união da inteligência humana e a artificial, enquanto ignoramos os perigos que já atravessam a sala, o quarto, a vida. Repito, estamos exaustos. Descansamos, mas nada muda. Vivemos assim — anestesiados, distraídos, achando que é normal.

 

O mundo exaurido pede consciência, mas a gente anda ocupado pensando se a Virgínia vai aprender a sambar até o Carnaval.

Mundo saturado por informação

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